Ontario dificulta a abertura de lojas de maconha

Depois da liberação do uso recreativo da maconha no Canadá, em outubro do ano passado, os canadenses formavam filas em frente às lojas especializadas em províncias como Alberta e Britsh Columbia, que com uma canetada permitiram a abertura das lojas. Esperava-se que o mesmo acontecesse nas demais províncias. Mas a euforia diminuiu.

Na província de Ontário, a mais populosa do Canadá, as licenças de lojas físicas são vendidas com restrição e controle. Estima-se que o governo tenha emitido 25 permissões de funcionamento até maio deste ano, apesar de apenas 11 estarem operando. Toronto abriu três lojas.

Duas dessas lojas ficam em uma das regiões mais descoladas da cidade, Queen Street West. São elas a Hunny Pot e a Nova Cannabis. Modernas e sofisticadas, elas chamam atenção por terem estampadas na fachada o famoso desenho da folha da planta, que foi proibida no Canadá por mais de século.

A Hunny Pot foi o primeiro estabelecimento legal de Toronto, inaugurado há quatro meses. Na vitrine não há produto exposto. Um recepcionista verifica a identidade de todos os clientes que passam pela porta. É preciso mais de 19 anos para entrar.

Do lado de fora vê-se pouco, mas dentro é possível ter uma aula sobre o assunto. O vendedor explica que a Cannabis indica é proveniente do subcontinente indiano (Afeganistão, Paquistão e Índia). Já a sativa vem das regiões equatoriais (caso da Jamaica e do México). A primeira acalma, enquanto a segunda energiza. Chama a atenção a quantidade de acessórios, de charutos a cortadores dos mais diversos modelos.

Mas o que mais salta aos olhos é a organização do espaço. No andar de baixo, há um balcão igual ao das lojas de fast-food, onde é possível escolher, em um painel, a quantidade e os tipos de flores secas, vendidas por grama, num sistema que lembra o das lojas de chá. A lei permite o porte de 30 gramas no máximo.

Nos rótulos estão dados como a data de validade, o fabricante e a quantidade de CBD e THC. Os dois ingredientes ficam destacados em pequenas placas para facilitar a escolha.

Muitos clientes entram por curiosidade e não compram nada. Há quem venha com a missão de encontrar acessórios mais sofisticados, como um narguilé de vidro colorido (150 dólares canadenses) ou um cachimbo do mesmo material (54 dólares canadenses). O cigarro de Cannabis é o produto mais comprado, me disse um vendedor. Tem 1 grama e 18,6% de THC. Custa 18 dólares canadenses, em média 5 vezes mais do que no Colorado (EUA). É preciso lembrar que todos os produtos levam um acréscimo de 13% de imposto.

Mas os preços não afastam os consumidores. “Eu prefiro pagar mais caro do que comprar no paralelo e ter problemas com a polícia”, me disse um dos clientes que preferiu não se identificar. Na hora de fechar a conta, o caixa novamente pede para conferir  a identidade.

Já a loja Nova Cannabis abriu há três meses. O sistema se assemelha com o da concorrente da Queen Street West, mas com comunicação visual mais eficiente que ajuda o cliente a localizar os produtos com mais facilidade. Todos ficam agrupados de acordo com a classificação anunciada sob placas como as de supermercados. Em vez de cereais e carnes, os letreiros indicam óleo, cápsula, comprimidos, fumos e variedades, entre outras.

A transparência do produto é elogiada –uma questão de saúde e segurança, dizem os clientes.

Mesmo com as lojas físicas, muitos canadenses preferem a comodidade da compra virtual. Até abril de 2018, o produto para uso medicinal, com CBD (componente que alivia dores) e THC (que dá o barato), era comercializado apenas pelo site do governo, o OCS (The Ontario Cannabis Store). As lojas físicas independentes vieram depois, mas o estado manteve a exclusividade da venda online

“Meu marido usa o óleo da Cannabis, que foi receitado pelo médico”, diz Akira Sepol, de 40 anos, mãe de duas filhas. “É uma dor crônica que nenhum outro medicamento aliviava. Eu também tomo, mas para cólicas”, diz ela, que nem sabia que Toronto já tinha lojas físicas.

Ela mostra o frasco, que vem acompanhado de um medidor de mililitros, indicando a quantidade para o paciente pingar diretamente na boca. Como cada um tem uma sensibilidade e estrutura física, o médico geralmente pede que o paciente fique atento para observar se as dores passam com a dose recomendada. Se não surtir efeito ou se der sono, Akira regula a quantidade com precisão até achar a medida ideal.

A agitação do mercado resulta em cifras generosas de impostos que antes não entravam para os cofres públicos. De acordo com o departamento de estatística do país, foram arrecadados U$ 139 milhões até junho. Na opinião de autoridades, a liberação resulta em mais empregos, novas oportunidades de negócios e uma forma de enfraquecer o tráfico de drogas.