Pesquisa científica inédita no Brasil analisa a eficácia da Cannabis no tratamento de enxaqueca

A Canopy Growth, uma das gigantes canadenses de Cannabis, e o Hospital Israelita Albert Einstein, centro de excelência em medicina, vão investir juntos em uma pesquisa inédita no Brasil. Com desenho e orçamento aprovado pela Anvisa (Agência de Vigilância Sanitária), o estudo clínico pretende analisar 110 pacientes com enxaqueca crônica, em tratamento convencional, mas sem grandes avanços nos resultados. O objetivo é testar a eficiência da Cannabis nestes casos.

Segundo a Organização Mundial de Saúde a enxaqueca é a 10ª doença mais incapacitante e atinge 15% da população mundial. As mulheres são as maiores vítimas. O número de casos entre elas é mais do que o dobro do que entre os homens, segundo o Ministério da Saúde do Brasil.

Muitos pacientes serão selecionados dentro do próprio banco de dados do hospital, pelo coordenador do estudo, Alexandre Kaup, neurologista especializado em cefaléias, distonias e espasticidades. Além de ser pesquisador clínico do Einstein, ele coordena o Departamento Científico de Neuroepidemiologia da Academia Brasileira de Neurologia. Mas isso não quer dizer que outras pessoas não possam participar. “O mais importante é o voluntário estar dentro dos critérios”, explica Kaup.

“Há mais de 150 tipos de cefaléias. Entram no estudo os casos crônicos. Trata-se de quadros graves que se repetem pelo menos três vezes por ano”, diz Kaup. “Entra nesta categoria a dor de cabeça persistente acompanhada de sintomas como náusea, fotofobia e irritabilidade provocada por barulho durante 15 dias ou mais.”

O neurologista Alexandre Kaup, especializado no tratamento de cefaléias, coordena a pesquisa com Cannabis no Einstein. (Foto: Divulgação)

“Vamos acabar com o argumento de que não existe pesquisa científica de Cannabis”, diz  o médico Wellington Briques, diretor global para a área médica da Canopy Growth, referindo-se ao argumento mais contundente contra o tratamento com as substâncias da planta.

No Brasil, a ciência já não é uma prioridade, mas perde ainda mais relevância aos olhos dos coordenadores das instituições quando objeto do estudo é a Cannabis. O plantio não é permitido nem para estudo nas universidades, com exceção das que estão no estado do Rio de Janeiro. A importação da matéria prima aumenta muito o orçamento, sem contar o preconceito sobre o tema..

Wellington Briques: idealizador da pesquisa. (Foto: Divulgação)

Briques foi o grande responsável pelo estudo se concretizar. Meu primeiro encontro com o médico foi em junho de 2019, quando a Canopy Growth anunciou a chegada no Brasil a um pequeno grupo de jornalistas durante coletiva. Ele era um dos executivos do grupo, mas chamava a atenção pela tranquilidade, simpatia, discrição e modos polidos de cavalheiro– mas principalmente por ter uma meta bem clara, a pesquisa científica.

Desde que chegou à São Paulo, o cenário econômico internacional mudou muito. O mercado de Cannabis passou por queda de vendas e grandes empresas como a Canopy tiveram de enxugar custos. Veio ainda a pandemia da Covid-19. Mesmo assim, Briques continuou firme sobre a necessidade das pesquisas científicas. “Temos muitas evidências clínicas nos consultórios que precisam ser confirmadas.”No início do mês, ele me ligou com a excelente notícia de que finalmente estava com o projeto redondo.

“O estudo será duplo cego. Metade receberá CBD (canabidiol) e THC (tetrahidrocanabidiol) e a outra metade,  placebo”, conta. O recrutamento de voluntários  já começou. Fique de olho, em 2021 começa a pesquisa com os pacientes selecionados que serão acompanhados por 1 ano.